domingo, 30 de novembro de 2008

Livro de Mirdad: A Grande Nostalgia


Os homens da Pequena Nostalgia são aqueles que, tendo construído um mundo com os seus sentidos, logo o acham pequeno e abafado, e aspiram a um lar maior e mais arejado, mas ao invés de procurarem novos materiais e um novo mestre de obras, empilham o mesmo material e chamam o mesmo arquiteto – os sentidos – para lhes construir o novo lar. E mal este está pronto, acham-no tão pequeno e abafado quanto o velho. Assim, vão demolindo e construindo, sem jamais conseguirem o lar que lhes possa dar o conforto e a liberdade por que anseiam; eis que confiam nos enganadores, para que os livrem dos enganos. Como o peixe que salta da frigideira para o fogo, fogem de uma pequena miragem para serem iludidos por outra maior.

Ente os homens da Grande Nostalgia e os da Pequena Nostalgia está a grande multidão dos homens coelhos que não sentem Nostalgia alguma. Estão satisfeitos em cavar suas tocas, nelas viver, reproduzir-se e morrer: e acham as suas furnas muito elegantes, espaçosas e quentes. Não as trocariam pelos esplendores de um palácio real e zombam dos sonâmbulos, especialmente daqueles que caminham por uma trilha solitária, onde as pegadas são raras e difíceis de serem vistas.

O homem que tem a Grande Nostalgia e se encontra entre os outros homens, é muito semelhante ao filhote de águia chocado pela galinha doméstica junto com a sua ninhada. Seus irmãos-pintinhos e mãe-galinha desejam que o jovem filhote de águia seja tal como eles, com a sua natureza e hábitos, vivendo como eles vivem; e o jovem filhote de águia gostaria de que os outros fossem como ele: sonhando com um ar mais livre e um céu ilimitado. Logo, porém, seus irmãos de ninhada o consideram um estranho e um paria entre eles, e ele recebe bicadas de todos- até mesmo de sua mãe. A voz das alturas, porém, lhe fala no sangue, e a fedentina do galinheiro torna-se insuportável para o seu nariz. No entanto, aceita em silêncio tudo aquilo, até que se encontre completamente emplumado. Abre então as suas asas e se lança ao espaço, com um amoroso olhar de despedida a seus antigos irmãos e a sua mãe que cacareja, alegremente, enquanto cisca a terra em busca de sementes e vermes.

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