domingo, 13 de julho de 2008

Cópia



A onda e a sombra

Homem ao mar!
Que importa? O navio não pára. O vento sopra, o sombrio navio continua em sua rota forçada e passa.
O homem desaparece, depois reaparece, mergulha e volta à tona, chama, estende os braços; ninguém o ouve. O navio, estremecendo sobre o tufão, está voltado a suas manobras; nem os marujos nem os passageiros vêem mais o homem submerso; sua cabeça é apenas mais um ponto escuro na imensidão das ondas.
Grita desesperadamente das profundezas. Que espectro essa vela que foge! Olha freneticamente para ela. E ela se afasta, vai desaparecendo, some. Havia pouco ainda ele estava lá, fazia parte da tripulação, ia e vinha no convés com os outros, tinha sua porção de ar e de sol, vivia. Agora, o que havia acontecido? Escorregara, caíra, tudo se acabara.





Está dentro da água, que é monstruosa. Sob os pés, nada mais que ruína, nada encontra. As vagas envolvem-no pavorosamente, rasgadas e sacudidas pelo vento; o vai-e-vem do abismo o empurra; os farrapos das águas agitam-se em volta de sua cabeça; uma multidão de ondas rebenta sobre ele; estranhas aberturas quase o devoram; cada vez que afunda, entrevê precipícios escuros; uma medonha vegetação o prende, emaranha-se em seus pés, o atrai para ela; ele sente se transformar em abismo, fazer parte da espuma; as ondas jogam-no de um lado para o outro; ele bebe o amargo; o oceano, covarde, se empenha em afogá-lo; a imensidão brinca com sua agonia. Parece que toda essa água é ódio.


Mas ele luta.
Tenta defender-se, tenta sustentar-se, esforça-se, nada. Ele, pobre força logo esgotada, combate o inesgotável.
Onde está o navio? Longe. Mal se avista por entre as trevas pálidas do horizonte.
Sompram rajadas; a espuma das ondas o vence. Levanta os olhos e não vê mais a lividez das nuvens. Assiste agonizante ao imenso delírio do mar e é ele o castigado por essa loucura. Ouve ruídos estranhos ao homem, que parecem vir de fora da terra e de algum terrível lugar.
Há pássaros nas nuvens, assim como há anjos por cima dos infortúnios humanos. Mas o que podem fazer por ele? Os pássaros voam, cantam, planam, e ele, agoniza.
Sente-se sepultado ao mesmo tempo por esses dois infinitos: o oceano e o céu; um é o sepulcro, o outro, mortalha.


Vem a noite. Há horas que ele nada, está no fim de suas forças; aquele navio, aquele vulto longíquo onde havia homens, apagou-se; ele está só num formidável turbilhão crepuscular; afunda, se debate, se retorce, sente abaixo monstruosas vagas do invisível; chama.
Não há mais homens. Onde está Deus?
Grita. Alguém! Alguém! Grita sem parar. Nada no horizonte, nada no céu.
Implora ao espaço, à onda, à alga, ao recife; são surdos. Suplica à tempestade; a tempestade, impertubável, só obedece ao infinito.
Em torno dele, escuridão, névoa, solidão, tumulto tempestuoso e inconsciente, redemoinho incessante das águas bravias. Dentro dele, horror e cansaço. Abaixo dele, a desgraça. Nenhum ponto de apoio.
Pensa nas tenebrosas aventuras de um cadáver na escuridão sem limites. Um frio imenso o paralisa. Suas mãos crispam-se, fecham-se e agarram o nada. Ventos, nuvens, turbilhões, rajadas, estrelas inúteis! Que fazer? Desesperado, abandona-se, cansado, deixa-se morrer, não se importa, deixa-se ir, larga mão, para sempre avança pelas lúgubres profundezas da voragem que o engole.

Ó implacável marcha das sociedades humanas! Perda de homens e de almas no meio do caminho! Oceano, onde desaparece tudo o que a lei desampara! Sinistro sumiço de socorro! Ó morte moral!

Mar, a inexorável escuridão social onde a penalidade arremessa seus condenados. Mar, a imensa miséria!
A alma, na correnteza desse abismo, torna-se cadáver. Quem a ressucitará?


Victor Hugo. Os Miseráveis, vol.I Livro Dois "A Queda", cap.VIII


4 comentários:

Madame Nada disse...

Tinha feito um comentario aqui, mas ele sumiu antes de eu publicar. Eu ein.

Anônimo disse...

Tente de novo

Madame Nada disse...

Nao, ja te falei tudo no msn.

Anônimo disse...

MSN...maria suzana natália!

tudo falado, combinado, acertado...
nada feito, nem lenine, nem zeca balero
em paraná, pi acaba
os miseráveis psicopatas americanos não vão me pegar!
antes disso, eu os afogo no mar!